Por Lucas Hirata e Daniela Meibak – Valor Econômico
06/05/2019 – 05:00
A surpresa com o repique da inflação nas últimas semanas não parece ter abalado as expectativas de corte de juros em 2019. Pelo contrário, o cenário de queda da Selic tem até ganhado espaço entre analistas, que atrelam o salto dos índices de preços a fatores transitórios, sem grande influência sobre o caminho esperado para a política monetária.
A eventual mudança no juro básico justifica-se na atividade persistentemente fraca. Cada vez mais especialistas esperam que o Banco Central incentive mais a economia. Mas não antes de a confiança na aprovação da reforma da Previdência aumentar.
De 62 economistas ouvidos pelo Valor, 61 esperam a manutenção da Selic no patamar atual de 6,5% no fim da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que acontece na terça e quarta-feira desta semana.
Há quem acredite que a necessidade de estímulos é tamanha que o BC deveria cortar a Selic já nesta reunião de maio. É o caso da Austin Rating, que aposta na redução da taxa em 0,50 ponto percentual. Embora isolada, a casa antecipa um movimento defendido por cerca de um terço do mercado para até o fim de ano.
Das casas consultadas, 22 acreditam na redução da Selic até o fim de dezembro, 39 mantêm a aposta na manutenção e uma instituição vê alta até lá. O grupo que defende o corte da Selic até aumentou um pouco desde a última decisão do Copom, em março. De lá para cá, esses analistas passaram a representar 35% do total dos entrevistados, acima dos 26% consultados pouco antes do anúncio anterior do colegiado. A Selic está em 6,5% ao ano desde março de 2018.
“A inflação foi alta nos meses de março, abril e até maio, mas trata-se de uma situação conjuntural. Já a atividade econômica fraca é uma situação estrutural e os dados da produção industrial reforçaram isso”, diz Alex Agostini, economista-chefe da Austin.
O raciocínio na instituição é que o espaço para o BC dar um impulso na economia está se esgotando, dada a defasagem do efeito das decisões do Copom na atividade. Assim, seria preciso vir logo com corte de juros.
Evidência da anêmica recuperação econômica, a produção industrial sofreu contração de 1,3% em março ante fevereiro, num resultado que ficou abaixo da média esperada pelos analistas, de queda de 0,7%. O resultado fraco da produção industrial aumenta o risco de um Produto Interno Bruto (PIB) negativo no primeiro trimestre, alerta Alberto Ramos, economista do Goldman Sachs. Na pesquisa Focus, a projeção do crescimento em 2019 tem sido revisada para baixo, semana após semana, desde o começo de março, saindo de 2,5% para 1,7%.
O risco de frustração com a reforma da Previdência impede, no entanto, que os demais especialistas confiem na flexibilização imediata da política monetária. Camila de Faria Lima, economista-chefe da Canvas, espera o corte em algum momento do segundo semestre, de forma a chegar no fim de dezembro com 5,75%. “Um encaminhamento satisfatório da agenda de reformas, em especial a da Previdência, conjugado a um cenário externo benigno, tende a contribuir diretamente para a redução dos juros”, afirma.
O mercado de juros futuros, da B3, que reage de maneira mais dinâmica aos indicadores econômicos, voltou a embutir uma probabilidade pequena de corte da Selic em 2019 após os dados de produção industrial. Antes disso, porém, o segmento passou por uma firme correção nas últimas semanas, quando praticamente zerou a chance de flexibilização em 2019, na esteira da surpresa com o avanço do IPCA de março e do IPCA-15 do mês seguinte.
Para alguns analistas, os choques inflacionários de curto prazo, assim como o salto do dólar para mais de R$ 3,90, podem ser considerados ruídos para a política monetária. “Ou seja, não alteram a tendência benigna e o cenário geral para a inflação, mas podem levar o Banco Central a utilizar mais tempo para a reavaliação de política monetária e, portanto, adiar de alguma forma o corte de juros”, diz Rafael Cardoso, economista da Daycoval Asset Management.
Maurício Oreng, economista-chefe do Rabobank Brasil, ainda vê mais probabilidade de estabilidade na política do BC, mas reconhece que o cenário de corte tem chance significativa de se concretizar. Por ora, ele atribui 60% de probabilidade para o cenário de manutenção, contra 40% de corte, e explica que os fatores mais relevantes nas decisões até o fim do ano são a evolução das reformas, expectativas de inflação e atividade econômica.
“O meu cenário base ainda é de manutenção, mas reconheço que a chance de corte aumentou de um tempo para cá, em função da atividade econômica fraca. Esse é um fator importante”, diz Oreng. Por outro lado, destaca, não faz sentido o BC se antecipar aos fatos e, por exemplo, começar a cortar juros antes da aprovação da reforma da Previdência. “Nesse caso, é o risco é de os estímulos não se transmitirem para economia, por causa dos juros de longo prazo ainda elevados, e da própria confiança baixa. A transmissão fica comprometida se as condições não estiverem lá.”