Bolsonaro também pretendia uma transição mais longa, mas é dado como certo por alguns aliados que esse ponto será alterado pelos parlamentares
Alessandra Azevedo – Correio Brasiliense
16/02/2019 11:13
Após estudar várias propostas para a reforma da Previdência, o governo decidiu acabar com a possibilidade de aposentadoria apenas por tempo de contribuição, sem uma idade mínima, e deve sugerir três regras de transição para que a sociedade se adapte à mudança. A equipe econômica também quer alterar as regras de concessão de pensão por morte e do Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos e deficientes de baixa renda, com a possibilidade de que os pagamentos mensais fiquem abaixo de um salário mínimo.
O presidente Jair Bolsonaro ainda precisa fechar os últimos detalhes, que incluem as definições sobre o que fará com esses benefícios, e deve divulgar o texto na próxima quarta-feira. Até agora, os únicos pontos garantidos são a idade mínima, de 65 anos para homens e 62 para mulheres, tanto para iniciativa privada quanto para servidores públicos; e a transição, que deve durar 12 anos. Assim que a reforma for aprovada, a exigência será de 60/56 anos.
Uma das regras de transição prevê que, a cada ano, sejam acrescentados seis meses no cálculo, em uma espécie de “escadinha”. Em 2021, a idade mínima será de 61/57; em 2023, de 62/58; e assim por diante, até os 65/62, em 2031. A regra é mais dura do que a última versão proposta durante o governo do então presidente Michel Temer, que partiria de 55/53, em 2018, e chegaria a 65/62 só 20 anos depois, em 2038.
Essa é uma das três regras propostas pela equipe de Bolsonaro para suavizar o fim da possibilidade de aposentadoria por tempo de contribuição, que permite que homens deixem de trabalhar após 35 anos de serviço e mulheres, após 30, sem idade mínima. O governo deve propor uma transição específica para que a extinção dessa modalidade não prejudique muito quem está às vésperas de completar o tempo de contribuição, porém não tão perto da idade mínima exigida.
Se faltarem dois anos ou menos para que a pessoa atinja os 35/30 de serviço quando a reforma for aprovada, precisará pagar 50% de pedágio. Ou seja, quem estiver a um ano de completar o tempo de contribuição exigido atualmente terá de trabalhar por mais seis meses, mas não precisará completar a idade mínima — que, se a reforma for aprovada ainda em 2019, e sem mudanças no Congresso, será de 60/56.
Essa regra é bem específica: vale apenas para homens que tiverem completado pelo menos 33 anos de contribuição e mulheres que somarem 28 ou mais. Quem se encaixar na exigência poderá escolher a aposentadoria por tempo de contribuição e se livrar da idade mínima, caso prefira. Mas, nesse caso, além de pagar o pedágio, precisará arcar com o fator previdenciário, que diminui o valor do benefício. O fator leva em conta a idade, o tempo de contribuição e a expectativa de vida. Se, depois de fazer as contas, o contribuinte concluir que não vale a pena, pode avaliar as outras opções.
A terceira alternativa é o sistema de pontos, que já existe atualmente, mas passará a ser uma exigência para quem escolher essa transição. Nesse caso, será possível se aposentar quando a soma da idade com o tempo de contribuição chegar a, pelo menos, 86/96 (mulheres/homens), em 2019. A pontuação aumentará todos os anos, até chegar a 100/105, em 2033. Depois disso, a única possibilidade de aposentadoria será pela idade mínima, que já será de 65/62 ao fim do período de transição.
Para quem se aposenta hoje por idade (65/60) por não conseguir completar o tempo exigido de contribuição — geralmente os mais pobres, que ficam mais tempo na informalidade — haverá um “ajuste”: a regra para as mulheres subirá dois anos assim que a reforma for aprovada. Passará direto para os 65/62 anos.
Divergências
Especialistas acreditam que apresentar três regras de transição pode confundir ainda mais as pessoas e os parlamentares. O professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (USP) Hélio Zylberstajn, que participou da elaboração de uma das propostas analisadas pela equipe econômica, acredita que a melhor opção seria apresentar apenas uma regra. “O ideal seria uma coisa mais simples. A nossa proposta tem uma regra só, de aumentar um ano a cada dois anos, até chegar aos 65 para homens e mulheres”, pontuou.
Zylberstajn também avalia que manter uma distinção nas idades mínimas entre homens e mulheres faz diferença “pelo conceito”, mas “prejudica pouco” do ponto de vista econômico. O governo prevê economia de até R$ 1 trilhão com a reforma na próxima década, mesmo com idades distintas.
A diferenciação também não é defendida pela equipe econômica. Segundo o secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, a fixação da idade foi um meio-termo entre o que queria o grupo liderado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, e a ideia do presidente. Bolsonaro também pretendia uma transição mais longa, mas é dado como certo por alguns aliados que esse ponto será alterado pelos parlamentares.
“Aposentadorias precoces”
Pelas regras atuais, quem se aposenta por tempo de contribuição não é necessariamente quem trabalhou mais, mas quem completou mais tempo com carteira assinada. Uma pessoa que trabalhou informalmente pelo mesmo período, ou até mais, precisa esperar completar os 65/60 anos. A possibilidade é muito criticada por especialistas por perpetuar as chamadas “aposentadorias precoces” e beneficiar os mais ricos. Isso pode ser comprovado quando se analisa as médias dos benefícios recebidos. Em dezembro, quem se aposentou por tempo de contribuição conseguiu um benefício médio de R$ 2.362,38, enquanto os que se aposentaram por idade receberam, em média, R$ 1.135,10.